Copiado do Site da ABI.
PRIMEIRA PÁGINA
José Reinaldo Marques e Renan Castro
22/10/2010
A memória do Jornal do Brasil não se apagou, nem se apagará. Esta foi a conclusão do seminário “O JB que nós amávamos”, que, nos dias 20 e 21 de outubro, reuniu várias gerações de jornalistas e estudantes de Jornalismo, para falar sobre a importância histórica e do apogeu do diário de 119 anos, cuja última edição impressa circulou no dia 31 de agosto de 2010.
O debate também abordou outros temas, como a origem da crise que atingiu o JB — que também ameaça os demais veículos de imprensa —, a saída para o on-line e o futuro do jornal impresso. O encontro foi realizado no Auditório Oscar Guanabarino da ABI, que dividiu a coordenação do evento com o Instituto de Arte e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (IACS).
O fim da edição impressa do Jornal do Brasil, que para alguns já era uma espécie de “morte anunciada”, na avaliação de outros desencadeou uma série de reações positivas em benefício da sua memória, forçando uma reavaliação da mídia impressa, tanto do ponto de vista da prática jornalística, quanto da ótica da gestão.
Na opinião geral dos participantes, o seminário não só reafirmou o JB como um dos maiores veículos de imprensa do Brasil, como também proporcionou a realização de um rico debate sobre os novos rumos da impressa do País. Como disse Alberto Dines — um dos responsáveis pelo êxito histórico alcançado pelo Jornal do Brasil — “se considerarmos que a vida tem limites, oJB morreu. Mas ao mesmo tempo está vivo. Temos que revivê-lo. Há muita lição a ser aprendida na sua história”, afirmou o jornalista.
Abertura
A abertura do seminário coube à professora de Jornalismo da UFF, Silvia Moretzsohn, e ao Presidente da ABI, Maurício Azêdo. Ela disse que um dos objetivos da reunião era fazer “com que os mais jovens conhecessem a importância do JB e que os jornalistas mais antigos, como eu, que trabalharam no jornal nos anos 60, 70 e 80 pudessem recordar algumas passagens da sua vida profissional e da História do País”.
Maurício Azêdo revelou a sua satisfação com a grande presença do público jovem na platéia. E disse que uma das metas que a ABI pretende alcançar é atrair jovens jornalistas para o seu quadro social:
— A ABI se sente muito confortada com a presença de vocês, porque um dos desafios diante dos quais se encontra esta centenária Associação Brasileira de Imprensa é exatamente atrair os jornalistas jovens e os estudantes de comunicação para as atividades da Casa, porque é esse público que vai garantir a continuidade e a perpetuação da nossa instituição ao longo do tempo, afirmou o Presidente da ABI.
Ele ressaltou que o tema do seminário era um assunto de grande interesse para a ABI, porque oJornal do Brasil foi, ao longo de meio século, “o paradigma da melhor qualidade de jornalismo que se fazia no Rio de Janeiro e no Brasil”. O Presidente falou também que tanto ele quanto os membros da ABI tinham “uma relação afetiva muito forte com o JB”. E mencionou os testemunhos que os jornalistas Ancelmo Gois e Sérgio Cabral deram antes do final da versão impressa do jornal:
— O Ancelmo Gois mais de uma vez tem evocado a sua aventura de menino sergipano, que todo fim de tarde, junto a outros companheiros, ia ao aeroporto de Aracaju receber com sofreguidão a remessa que o Jornal do Brasil mandava para o seu estado natal. O Sérgio Cabral, quando o jornal ainda não havia enveredado pelo precipício que o levou ao seu fim, disse sem pestanejar que se ganhasse na Mega Sena compraria o JB para salvá-lo da extinção, afirmou Maurício provocando risos da platéia.
Em seguida foi exibido o documentário “Um moço de 74 anos”, de Nelson Pereira dos Santos, com narração de Alberto Cury. O filme é uma homenagem ao septuagésimo quarto aniversário do jornal, e reúne imagens preciosas da produção do diário nos anos 60. Trata-se de um documento importante que mostra o dia a dia da Redação e da oficina do Jornal do Brasil , na sua antiga sede, localizada na Avenida Rio Branco, nº 110, no Centro da cidade.
História
No primeiro dia do seminário foram debatidos os seguintes painéis: “Evocação e análise”, com o professor de Jornalismo Gráfico da UFF, Ildo Nascimento; e “Um jornal que fez história”, cujos palestrantes foram os jornalistas José Silveira, Ana Arruda Calado, Cícero Sandroni e Wilson Figueiredo. O tema foi abordado também por Alberto Dines, por videoconferência. A mediação foi do professor João Batista de Abreu (UFF).
Ildo Nascimento fez uma apresentação do seu trabalho de pesquisa sobre a reforma gráfica que o JB realizou nos anos 50 — comandada pelo artista gráfico Amílcar de Castro —, que se tornou uma referência da imprensa nacional e acabou sendo copiada pela maioria dos grandes jornais do Brasil: “A reforma foi um processo no dia a dia do jornal, pois não havia tempo para uma mudança radical. Os primeiros passos da reforma ocorreram de uma sexta para a terça-feira da semana seguinte”, contou o professor.
De acordo com Ildo Nascimento, as primeiras experiências de mudanças gráficas do Jornal do Brasil ocorreram nas administrações de Joaquim Nabuco e Ruy Barbosa. Uma delas na primeira página se tornou famosa, na edição sobre o falecimento de D. Pedro II, que Ildo considera graficamente interessante, “pois utilizava fio e tarja em volta da página, coisa que não era comum naquela época, principalmente em homenagens póstumas”.
No final do século XIX, surgiram outras mudanças. Foi quando o jornal passou sofrer popularização, com notícias policiais na primeira página, desenhos e festas populares:
— Na virada do século, o Jornal do Brasil era um veículo graficamente e visualmente muito interessante. Com muitos desenhos. Foi nesse período que surgiu a tradição da sátira da caricatura, da ilustração jocosa do jornal. Com o fim da Segunda Guerra Mundial o custo do papel estava muito alto e o JB foi hipotecado. Acabou sendo vendido para o Conde Ernesto Pereira Carneiro, que era casado com uma moça chamada Maurina, que mais tarde teve um papel importante na grande reforma do jornal nos anos 50.
Mérito
Alberto Dines disse que o grande mérito do JB é que ele não teve períodos, ou seja, não ocorreram mudanças na composição da Redação que afetassem a continuidade do projeto de reforma: “Vários grupos de jornalistas vieram para o Jornal do Brasil de 1956 até fins dos anos 80, mas mantiveram o mesmo padrão”, lembrou o jornalista.
Dines disse que um dos aspectos importantes da edição do Jornal do Brasil era ser um veículo contínuo, comportamento que ele enxerga como demonstração de respeito ao leitor:
— O leitor quer encontrar um jornal apaziguado. O JB encontrou esse milagre: dos anos 50 à década de 90 manteve um padrão de excelência. O que mata a nossa imprensa são os surtos messiânicos, quando aparece um Messias que muda tudo achando que está avançando, mas está regredindo. No JB, cada um chegava com a sua bagagem pessoal, mas o projeto era único.
Outro aspecto importante é que o jornal era um fenômeno eminentemente carioca. O Rio era a cidade de muitos ecos, inclusive políticos. “O Rio de Janeiro, apesar de não ser mais a Capital, era o centro do Brasil”, afirmou Dines, acrescentando que “a imprensa carioca precisa perceber que precisa se revitalizar, mas fazer o mesmo com o Rio de janeiro, porque, sem isso, fica-se numa coisa artificial”.
Um pensamento defendido por Alberto Dines é de que um jornal é uma organização de estudo que se desenvolve por meio do aprendizado. Segundo ele, o Jornal do Brasil percebeu isso quando começou a administrar cursos de jornalismo, organizados pelo Departamento de Pesquisa:
— O Gabeira foi um dos primeiros nessa função quando era editor, depois Roberto Quintaes. Em seguida fizemos os cadernos de jornalismo. Então era um jornal voltado para o aprendizado, para o aperfeiçoamento. Eu acho isso extremamente importante, porque se um jornal não se aperfeiçoa, se as pessoas não o enxergam como uma organização de aprendizado não vão se apegar e fazer com que o veículo transmita conhecimento, afirmou o ex-editor do JB.
Ele lembrou que no antigo JB as equipes se ligavam, as gerações se completavam. Na sua opinião, um jornal não pode ser feito apenas por um grupo, com uma geração apenas:
— Um jornal não pode ser feito apenas por uma geração senão ele fica falando com um grupo etário, quando deveria falar para todos eles. Esse talvez seja um dos grandes problemas da imprensa brasileira e da mídia de maneira geral, que são feitas por uma geração apenas.
O Jornal do Brasil era um conjunto de gerações que se sucederam e se completaram, disse Alberto Dines. Primeiro com o grupo de 1956 e depois os outros:
— São dados que não podem ser perdidos de vista. Hoje se pratica um jornalismo onde a relação já não tem importância. No JB era ao contrário, porque a Redação podia ser mal instalada e desconfortável, mas ali havia vitalidade, centelhas e eletricidade coletiva. Jornal é isso. Não adianta querer fazer um jornal inteligente se as inteligências não se aproximam.
O jornalista gaúcho José Silveira trabalhou no JB por mais de 20 anos, onde ocupou o cargo de Secretário de Redação, em dois períodos. Ele reforçou o que já havia sido dito por Alberto Dines anteriormente sobre o espírito de unidade da Redação do jornal. Ao se referir à sua passagem pelo diário, disse que percebeu que havia ali a compreensão “de que o jornalismo é um aprendizado diário, uma vez que os fatos não se repetem da mesma forma”.
Disse que para se obter êxito na produção de um jornal, como aconteceu com o Jornal do Brasil, é preciso lembrar que “o diálogo tem que existir entre todos os elementos da Redação e aqueles que fazem o prosseguimento dela”. Segundo ele, esse era o espírito da equipe com a qual trabalhava:
— A reforma foi feita pelo Amílcar e o Jânio, que eram os mais centrados deles e criaram uma filosofia de comportamento que, quem veio depois deles como o Dines, pôde fazer um jornal com a competência das suas intelectualidades. Quem viesse manteria o mesmo jornal, fazendo modificações que eram quase imperceptíveis, disse José Silveira.
Um outro dado importante destacado por José Silveira é que todos os grandes jornais como oEstadão e a Folha de S.Paulo, onde ele também trabalhou depois que saiu do Jornal do Brasil, é que a reforma gráfica do JB “foi tão copiada que o próprio jornal passou a copiar o que era copiado dele” (risos).
Encerrando a sua participação, Alberto Dines mandou um recado aos pesquisadores e aos estudantes de jornalismo, que estavam na platéia:
— O esforço dos biógrafos é examinar tudo o que aconteceu. O JB representou a inteligência do Rio, porque ele mesmo era fruto dessa inteligência. Renascer o Jornal do Brasil é o trabalho das novas gerações. Nós já fizemos nossa parte. Boa sorte!”
Diploma
Ana Arruda Calado era uma jovem recém-formada em Jornalismo quando foi contratada para trabalhar no Jornal do Brasil, onde ingressou como estagiária. O
chefe de Redação naquele momento era Odylo Costa, filho e Wilson Figueiredo, chefiava a reportagem. Disse que comentar esse período é sempre uma grande emoção:
— Falar do JB é sempre um prazer porque é aquele jornal que deixa saudade, com um agravante, pois foi o primeiro jornal no qual trabalhei. E o primeiro jornal a gente nunca esquece — lembrou Ana Arruda.
Em tempos em que a categoria de jornalistas briga pela defesa do diploma de jornalismo para o exercício da profissão, Ana Arruda Calado contou uma história curiosa:
— Eu tinha cursado Jornalismo na Faculdade de Filosofia, que era uma coisa muito rara naquele tempo. Meus colegas, por exemplo, só a Mary Ventura havia se formado também em jornalismo. Os outros todos eram funcionários públicos que faziam curso superior para obter promoção. Não tinham o menor interesse em jornal. Eu fui aconselhada a não dizer que tinha feito a graduação.
Ana Arruda recordou que ingressou como estagiária no JB em 1º de abril de 1958. Passou quatro anos no jornal, que ela diz terem sido maravilhosos. Disse que uma das coisas importantes que ela apreciava na Redação do JB é que não havia comportamento ditatorial por parte da chefia:
— Eles estavam ali para ajudar e ensinar e não para mandar os repórteres fazerem coisas absurdas. O repórter podia ter idéias. Eu dei sugestões sobre muitas reportagens que eu fiz, inclusive inaugurei uma coisa que estava meio esquecida que era a reportagem de arquivo. Fiz uma série de matérias sobre a reforma agrária, que me obrigou a freqüentar muitos dias a biblioteca da Câmara dos Deputados, que ainda era no Rio, lendo todos os projetos sobre o tema que tinham sido apresentados desde o Império.
Ela disse que uma das coisas que gosta de lembrar do tempo em que foi repórter no Jornal do Brasil era o trabalho em equipe:"Repórteres, motoristas e fotógrafos se ajudavam mutuamente". Na sua opinião, este foi o contexto que consolidou a história do jornal.
Liberdade
Na opinião do jornalista Cícero Sandroni, que é membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), falar da história do Jornal do Brasil na primeira metade do século XX tem muito a ver com liberdade de imprensa, que existiu no Brasil durante o Segundo Império:
— No tempo de D. Pedro II a imprensa era totalmente livre de censura. Inclusive quando abordavam esse assunto com o Imperador ele dizia o seguinte: “Se eu censurar os jornais, como vou saber o que os meus ministros fazem?”
Para Cícero Sandroni, com a República é que começaram os atentados contra a liberdade de imprensa, e “o Jornal do Brasil foi um dos mártires desses atentados”. Na sua opinião, “o JB não morreu por causa da internet, ele acabou por outras razões e não por força da web. Foi vítima de péssimas administrações”, disse o Acadêmico.
Wilson Figueiredo destacou que o sucesso do JB se deve à jovialidade da equipe de jornalistas que produzia o jornal:
— Eu acho que muito do sucesso que foi o Jornal do Brasil se deve à mocidade dos seus repórteres, editores e redatores, que foram se revezando. Em menos de 40 anos o jornal fez toda a sua fama. O que me impressiona nessa juventude é que ela representava a quebra do padrão tradicional de se fazer jornal de uma maneira formal e cheia de amarrações. Quase todos os jornais daquela época (anos 50) tinham um livro com os nomes que eram proibidos de serem citados. O Correio da Manhã tinha essas listas e o Jornal do Commercio também.
Outra revolução promovida na imprensa pela equipe do Jornal do Brasil foi com a maneira de escrever, da apresentação da matéria, acabando com o chamado nariz de cera:
— Isso o JB quebrou brilhantemente com um bando de repórteres novos. Isso foi importante porque se o jornal pensava que tinha um projeto, ele tinha um sonho que vinha sendo adiado até que um belo dia aconteceu de maneira improvisada, sem planejamento.
Sem planejamento porque segundo Wilson Figueiredo o seu colega Odylo Costa, filho não era homem de planejar, “era uma pessoa de inspiração e de improviso”:
— Ele fez uma mistura que acabou dando certo, embora tenha custado uma demora da organização da Redação. Esse talvez tenha sido o grande pecado do Odylo, não ter sido o organizador daquilo que ele criou com espírito de liberdade. Naquele tempo ainda havia uma restrição, que era o próprio jornalismo formal, com textos cheios de mesuras, afirmou Wilson.
Wilson Figueiredo falou com entusiasmo que o JB quebrou uma série de paradigmas na imprensa brasileira, a partir dos anos 60:
— O jornal criou uma irreverência de teorias, que se consagrou quando lançou o “Caderno B”, que prestigiava as coisas do Rio de uma maneira diferente dos outros jornais da época. O carnaval ganhou uma página inteira passou, com a história das figuras que passavam pelas escolas de samba, os compositores, os cantores. O jornal começou a usar isso como matéria viva e não como texto de favor, contou o ex-Diretor de Redação.
Acervo
Na segunda mesa do dia, entitulada “Jotabenianos: a memória afetiva e a política da redação”, contou com a participação de Sandra Chaves, Alfredo Herkenhoff, Agnaldo Ramos, Flávio Pontes, Romildo Guerrante e Evandro Teixeira, que contaram boas e velhas histórias, e lamentaram a situação atual do jornal. Apesar disso, manifestaram seu sentimento, que a princípio permanece vivo dentro de cada “ex-jotabeniano” daquela época.
Sandra Chaves, autora do blog ÁlbumJotaBeniano, contou como surgiu a ideia, a partir de uma foto enviada peã colega Tânia Rodrigues, que despertou nela a vontade de reunir outras fotos históricas da época de ouro da redação. A plateia presenciou depoimentos emocionantes de cada um, e uma exibição de fotos históricas e marcantes de Evandro Teixeira.
O veterano repórter-fotográfico Evandro Teixeira apresentou uma seleção das melhores fotos que produziu ao longo dos 47 anos em que trabalhou para o jornal. Disse que tem muito orgulho de ter feito parte da bem-sucedida trajetória da fotografia no Jornal do Brasil, cujo acervo “é um dos mais importantes da imprensa brasileira”:
— O JB sempre foi o berço do jornalismo brasileiro e da fotografia em especial. Por ali passaram grandes jornalistas e fotógrafos. Trata-se de um veículo soube valorizar a fotografia, afirmou Evandro.
“A primeira página do Jornal do Brasil era a vitrine do jornalismo nacional”, afirma Evandro Teixeira, acrescentando que o veículo sempre teve o brilhantismo de mostrar da melhor maneira a realidade dos fatos, “desde os dramas de enchentes, problemas sociais no Brasil e no mundo, até o carnaval”.
Evandro Teixeira falou que aprendeu muito de fotografia trabalhando no JB. Fez coberturas importantes como Copas do Mundo, Olimpíadas e as visitas da Rainha Elizabeth e do Papa João Paulo II ao Brasil. Acha difícil indicar qual teria sido a sua melhor foto, mas deixa escapar que sente uma emoção diferente com a cobertura da morte do poeta Pablo Neruda:
— Aconteceu durante uma reportagem que eu fui fazer sobre golpe militar no Chile, em 1973, onde eu tive a honra, o prazer, alegria e a tristeza ao mesmo tempo de ter sido o único fotojornalista a fotografar o Neruda morto. O JB me proporcionou tudo isso. Ali eu vivi momentos importantes da expressão do fotojornalismo.
Filme
O segundo dia do seminário “O JB que nós amávamos”, começou com discurso do Presidente da ABI Maurício Azêdo, sobre a importância do evento e a responsabilidade dos jovens estudantes presentes, pelo que será do Jornalismo nas próximas décadas. Em seguida, foi exibido o programa do Observatório da Imprensa de 20 de Julho deste ano, sobre o fim da versão impressa do Jornal do Brasil.
Após o programa, a plateia assistiu ao vídeo “Av. Brasil, 500”, de Rogério Reis, com fotos da antiga sede do jornal na Avenida Brasil, ao lado de fotos históricas da redação ainda em funcionamento.
A primeira mesa de debates do dia teve como mediador Gilberto Menezes Cortes, e a participação de Paula Máiran, ex-repórter do JB, Suzana Blass, Presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, e Nilo Dante, que trabalhou no jornal em diversas épocas diferentes, inclusive durante a reforma gráfica do jornal na década de 50.
Menezes Cortes abriu a discussão sobre “As Origens da Crise” lembrando do início da perda de leitores jovens e da concorrência desleal do O Globo nos classificados. Ele falou também das consequências da redução de profissionais na redação e de correspondentes internacionais, que chegaram a ser 15 no Jornal do Brasil. Cortes também criticou o jornalismo preguiçoso feito na internet, e fez uma crítica: “Jornalismo acomodado não existe”, disse.
Paula Máiran, que começou justamente pelos classificados, contou um pouco de sua trajetória no jornal, e os sintomas da crise que presenciou durante a década de 90, até seu pedido de demissão em 2002. Ela criticou a falta de planejamento e ações de marketing do veículo, além da soberba de não aceitar diminuir o preço dos anúncios. Segundo ela, esses fatores, aliados à tática agressiva de O Globo e desvios financeiros de funcionários do próprio jornal, contribuíram diretamente para a falência do jornal como era.
Nilo Dante, através de exposição de imagens sobre a história e o futuro da imprensa, citou problemas atuais, com críticas e comentários. Ele falou sobre questões cruciais para a decadência não só do JB, mas também da circulação de outros jornais impressos no Brasil. Para ele, a crise começou em 1983 e se agravou pela “administração inepta e predadora”. Classificou ainda os donos de jornais de hoje como “senhores feudais da informação”.
Paula ainda mencionou fatos importantes como o elitismo e o racismo presentes em sua época de JB, na qual ainda existia a proibição de fotos de negros na primeira página, por exemplo. Em um encerramento esperançoso, ela levantou alternativas para salvar o jornal, e disse ainda acreditar em uma mudança, como destacou: “Nada deve parecer natural, e nada deve parecer impossível de mudar”.
On-line
A segunda mesa de debates do dia 21 foi sobre o futuro do jornal impresso. Contou com a presença por vídeo conferência de Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Grupo Estado; Caio Túlio Costa, ex-Folha de S. Paulo, professor universitário e consultor em novas mídias; e Rosental Calmon Alves, professor da Universidade do Texas, e um dos que inovaram ao colocar o JB na internet em 1995. Pessoalmente, participou da mesa Orivaldo Perin, editor executivo doGlobo, também ex-Jornal do Brasil.
O discurso dominante da mesa foi sobre a necessidade de reinvenção do jornal impresso, a partir de novas formas de abordagem, gestão e de adaptação à nova configuração atual da informação e comunicação. Gandour sustentou a necessidade da convivência e convergência entre as diferentes plataformas, sem abandonar nenhuma totalmente. Defendeu também um novo modelo de gestão empresarial, adaptado às novas tecnologias como os Tablets e Ipads, pelo alto custo agregado da produção de um jornal impresso.
Caio Túlio concordou com Gandour sobre a necessidade de uma nova lógica empresarial, e alertou para o desafio enfrentado atualmente das mídias interativas e o “jornalismo colaborativo”, que deu às pessoas o poder de jornalistas. Tal novidade, segundo Caio, faz com que a prática jornalística seja repensada, em termos de apuração e credibilidade. Perin apontou para a possibilidade de o jornal se tornar apenas um curador de notícias dentro desse cenário.
Rosental, por sua vez, chamou atenção para o que classificou de “enorme revolução sem paralelos na história da humanidade”, que diz respeito à grande quantidade de informação a que estamos expostos hoje. Ressaltou ainda que não se deve ignorar tais mudanças, e aposta nas mídias sociais como possibilidade de democratização da informação.
Para ele, apesar da imensa desigualdade social ainda existente no Brasil, as novas tecnologias digitais podem ser entendidas como uma ferramenta de inclusão e não de exclusão social. E dá o exemplo do aumento do número de celulares adquiridos por pessoas mais pobres.
Orivaldo Perin comentou que mesmo com a queda de circulação, o jornal impresso ainda representa 95% do faturamento do O Globo, apesar do crescimento da participação da Internet nos últimos anos, e do sonho de qualquer dono de empresa de informação de ter um veículo sem a base industrial, para diminuir os custos.
Futuro
Em sua avaliação sobre os novos rumos do Jornalismo, Rosental concluiu que “o jornal impresso sozinho está morto. Dependerá da criação de uma nova estrutura não centralizada no papel, capaz de entender a nova lógica”. Acrescentou também o advento das redes sociais como oTwitter, no processo de integração entre a internet e o jornalismo como um todo.
Perin citou a integração física das redações do impresso e do on-line no O Globo como exemplo de tendência para o futuro. Mas levantou o contraponto de que a internet também não sobrevive sem a credibilidade das grandes empresas de comunicação, que trazem maior quantidade de acessos a seus sites: “Os grandes portais de informação têm por trás uma marca de papel”, afirmou o jornalista.
Rosental prevê que o jornal no papel não desaparecerá, assim como não desapareceu após o surgimento da TV e do Rádio. O desafio de agora é se adaptar à web e às outras mídias digitais:
— O jornal vai continuar uma tendência que já vinha tendo nas últimas décadas de ser mais analítico e explicativo, mais prazeroso de ler, como as revistas semanais faziam, afirmou.
Sobre essa mudança, Orivaldo Perin acrescentou que deve ser cuidadosa, e se adaptar ao novo tipo de leitor. Outra transformação essencial citada pelo editor do Globo foi sobre a visão dos anunciantes, ainda muito dependentes da mídia impressa.
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